O grande herói, o viajado.
As viagens já
não são desculpa para ninguém. Nem mesmo para o maior ingénuo, o maior falhado,
aquele que me deixa sempre, educadamente, no início do ciclo. Depois de te
ajudar a fazer as malas e depois do medroso e já arrependido «quanto tempo vais
estar fora desta vez?». Já nem o que sinto por ti chega para acreditar que vale
a pena.
Acordei contigo
ao meu lado, despenteado e preguiçoso. Comecei aquela luta interna para tentar
chegar ao relógio que está na mesinha cabeceira. Inesperadamente, sinto-me a
cair e acordo onde me deixaste. Usaste-me, fizeste de mim o teu porto seguro,
aquele lugar cheio de almofadas e sacos de água quente, onde tudo está pronto
para receber o aventureiro. O grande herói, o viajado.
Aquela última
vez que te vi na esplanada, percebi o que realmente vale a vida. Percebi também
que não valemos o mesmo na vida um do outro. A mim bastava-me o alívio da tua
mala a cair no sofá da nossa sala secreta. O reconforto da tua gravata
esquecida no nosso chão.
Mas agora, não
há mais ciclos. Não vão existir mais chegadas para que haja partidas. Houve uma
última partida, que me deixou desejosa que nunca tivesses voltado. Não da
maneira que voltaste, altivo, distante e amargo.
Agora receio
como nunca reencontrar-te, receio a hora em que todos os ensaios se vão tornar
devaneios.
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